Amesterdão. 1962. Munique. 2016
Benfica

Amesterdão. 1962. Munique. 2016


NOVE JOGOS PARA ARREBATAR A PRIMEIRA. SETE ENCONTROS PARA SER BICAMPEÃO EUROPEU.

Dois dos melhores avançados da história do Futebol Mundial: o "nove" José Águas (avançado-centro) e o "onze" Gento (extremo-esquerdo). O espanhol continua a ser o jogador com mais sucesso na competição: seis finais conquistadas: o Penta (1956 a 1960) mais a de 1966!

Muitas mudanças existiram nos regulamentos na Taça dos Clubes Campeões Europeus (TCCE). Durante uma década os segundos classificados do país em que um clube fosse, na mesma temporada, Campeão Nacional e Campeão Europeu podiam participar na época seguinte na TCCE. Houve três situações dessas!

Bem as mereceu. Duas gémeas com quase um ano de diferença, ambas de Maio, 31 e 2, para quem nunca teve filhos!

As particularidades das primeiras Taças dos Clubes Campeões Europeus
O Benfica para conquistar a “Primeira” realizou nove jogos (quatro na “Saudosa Luz”, quatro em terreno alheio (Edimburgo, Budapeste, Aarhus e Viena) e a final em campo neutro (Berna/Suíça). O Campeão Europeu ficava isento da primeira eliminatória (correspondente a uma espécie “encurtada de 16-avos-de-final - 13 jogos/26 clubes em vez de 16 jogos/32 clubes) daí fazer sete jogos para conseguir revalidar o título, com a “Segunda”: três na “Saudosa Catedral”, três “fora” (Viena, Nuremberga e Londres) e um em país neutro (Holanda/Amesterdão). Além disso o regulamento da competição permitia que se houvesse simultaneidade – Campeão Europeu e Campeão Nacional - o segundo classificado deste campeonato nacional pudesse participar na TCCE. No início, tal como na actualidade (embora agora em maior número) como se percebe, havia clubes que não eram campeões nacionais a participarem na competição reservada aos campeões de cada país! De outro modo. O país que tivesse o Campeão Europeu tinha direito a dois clubes na edição seguinte da competição. Era a essência de ser um título. O titular mesmo que não fosse campeão nacional defenderia o título conseguido na temporada anterior. O regulamento – que permitia a participação na TCCE do 2.º classificado de um campeonato nacional que tivesse como campeão nacional, o Campeão Europeu foi alterado no início dos anos 60. A Espanha durante cinco edições, entre a 2.ª e a 6.ª (esta última conquistada pelo “Glorioso”) teve sempre dois representantes. Em 1965/66 já não vigorava. Nesta temporada o FC Inter Milão foi o único representante de Itália, apesar de ser Campeão Europeu e nacional, em 1964/65. Apenas três clubes beneficiaram durante, pelo menos uma década, dessa prerrogativa: Sevilha FC e Clube Atlético Madrid, de Espanha; e Sporting CP, de Portugal. Foram segundos classificados (vice-campeões como "título" para o nosso Sporting CP) mas participaram numa competição designada «Coupe des clubs champions européens». Em francês, pois a Taça dos Clubes Campeões Europeus foi uma ideia de um jornalista francês (Gabriel Hanot do jornal L'Équipe).

ÉPOCAS COM PAÍSES COM DOIS PARTICIPANTES ENTRE 1956/67 E 1964/65
Época
Campeão Europeu
Segundo classificado no CN*
Clube
Cl**
País
Clube
País
Cl
1955/56
Real Madrid CF
3.º
ESP
-----
---
--
1956/57
Real Madrid CF
CN
ESP
Athletic C. Bilbau
ESP
CN
Real Madrid CF
ESP
CE
1957/58
Real Madrid CF
CN
ESP
Sevilha FC
ESP
2.º
Real Madrid CF
ESP
CE
1958/59
Real Madrid CF
2.º
ESP
C. Atlético Madrid
ESP
2.º
Real Madrid CF
ESP
CE
1959/60
Real Madrid CF
2.º
ESP
FC Barcelona
ESP
CN
Real Madrid CF
ESP
CE
1960/61
SL BENFICA
CN
POR
FC Barcelona
ESP
CN
Real Madrid CF
ESP
CE
1961/62
SL BENFICA
3.º
POR
Sporting CP
POR
2.º
SL BENFICA
POR
CE
1962/63
AC Milan
3.º
ITÁ
Sporting CP
POR
CN
SL BENFICA
POR
CE
1963/64
FC Inter Milão
2.º
ITÁ
FC Inter Milão
ITÁ
CN
AC Milan
ITÁ
CE
1964/65
FC Inter Milão
CN
ITÁ
Bolonha FC 1909
ITÁ
CN
FC Inter Milão
ITÁ
CE
1965/66
Real Madrid CF
2.º
ESP
AC Milan (2.º) NP ***
NOTA: * Temporada anterior; ** Classificação no campeonato nacional da mesma época; *** O AC Milan foi 2.º classificado no campeonato italiano, em 1964/65, com o FC Inter Milão a sagrar-se, em simultâneo, campeão europeu e nacional. O AC Milan em 1965/66 não teve direito a participar na TCCE competindo na Taça das Cidades Com Feiras reservada aos clubes melhor classificados nos respectivos campeonatos sem vaga na TCCE e na Taça dos Clubes Vencedores das Taças (Nacionais), extinta em 1998/1999

Heróis de Amesterdão. De cima para baixo. Da esquerda para a direita: Ângelo, Cruz, Mário João, Cavém, Germano e Costa Pereira; José Augusto, Eusébio, José Águas (capitão), Coluna e Simões

Amesterdão (1962)
Na 7.ª edição da Taça dos Clubes Campeões Europeus, em 1961/62, a Espanha voltou a ter apenas um representante. Facto inédito desde a primeira edição (1955/56). Em cinco, entre 1956/57 e 1960/61, contara sempre com dois. Em 1960/61 o Real Madrid CF foi “obrigado” a sagrar-se campeão nacional para poder participar na edição de 1961/62 da TCCE. O finalista vencido (pelo SLB) da TCCE, em 1960/61, FC Barcelona classificou-se em 4.º lugar no campeonato de Espanha… a 20 pontos do Real Madrid CF. Até isto serviu na imprensa de Espanha, em Madrid, para justificar que a edição da TCCE em 1961/62 retomaria a “normalidade”.

O bilhete para ver um dos melhores jogos de sempre na principal competição da UEFA

O Real Madrid CF foi categórico
A ansiedade foi a nota dominante na Imprensa, particularmente a de Espanha e de Madrid, durante a competição de 1961/62. «Nunca mais chega a final para saber qual o clube que o Real Madrid CF vai derrotar»! Apesar de algum respeito pelo Benfica, “temido mas acessível” desejado nas três eliminatórias a duas mãos (“oitavos”, “quartos” e meias”). Com o “Glorioso” isento da primeira eliminatória, coube ao Real Madrid CF começar a “vindima”. Vasas SC arrumado com 5-1: 2-0 em Budapeste e 3-1 em Madrid. “Oitavos”: 12-0 ao BK 1913 com 3-0 em Odense (Dinamarca) e 9-0 em Madrid (recorde de diferença de golos marcados num jogo pelo clube a apenas um golo dos 10-0, em 1956/67, do Manchester United FC ao RSC Anderlecht). E que melhorava o 8-0 ao Sevilha FC, em 1957/58, que eliminara o SLB na sua primeira participação. Nos quartos-de-final a caminhada foi mais complicada frente à Juventus FC. Em Itália os clubes tentavam acabar com a “malapata” na principal competição europeia. À vez, todos queriam ser “os primeiros” a chegar ao título de Campeão Europeu.

OS CAMPEÕES DE ITÁLIA NA TAÇA DOS CLUBES CAMPEÕES EUROPEUS
Época
Clube
Elm
Adversário
Resultados
Nome
País
1.ª m
2.ª m
Ac.
1955/56
AC Milan
1/2
Real Madrid CF
ESP
(F) D 2-4
(C) V 2-1
4-5
1956/57
ACF Fiorentina
FIN
Real Madrid CF
ESP
Madrid/Espanha
D 0-2
1957/58
AC Milan
FIN
Real Madrid CF
ESP
Bruxelas/Bélgica
D 2-3
1958/59
Juventus FC
1/16
SK Rapid Viena
ÁUS
(C) V 3-1
(F) D 0-7
3-8
1959/60
AC Milan
1/8
FC Barcelona
ESP
(C) D 0-2
(F) D 1-5
1-7
1960/61
Juventus FC
1/16
PCF CSKA Sófia
BUL
(C) V 2-0
(F) D 1-4
3-4

A Juventus foi um “osso duro de roer”
Incentivada pela Imprensa transalpina, o clube de Turim obrigou o Real Madrid CF a sofrer. Mesmo perdendo em Itália, por 1-0, conseguiu ir fazer o impensável. Vencer pelo mesmo resultado o adversário em Madrid. Terceiro jogo, em Paris, no Parque dos Príncipes com vitória categórica, do Real Madrid CF, por 3-1. Nas meias-finais outro “passeio”: 6-0 ao Real Standard Liège, com 4-0 em Madrid e 2-0 em Liège. Estava feito o que se previra desde que como campeão de Espanha assegurara a participação na TCCE em 1961/62 com nove jogos, oito vitórias e uma derrota e 27-3 em golos (diferença de 24 golos!). O outro finalista, campeão europeu em título, mostrava valores mais modestos, mas também impressionantes: seis jogos, com três vitórias, um empate (1-1, em Viena) e duas derrotas (1-3, em Nuremberga e 1-2, em Londres), mais 17-8 em golos, diferença de nove! Sem conseguir vencer qualquer jogo dos três realizados em terreno alheio, o Benfica foi o primeiro clube a apurar-se para a final (5 de Abril de 1962, em Londres). Seguiu-se o Real Madrid CF (12 de Abril de 1962, em Liège) embora os 4-0 da primeira mão fossem “passaporte com garantia” de passagem!


O enigma. Porque foi o guarda-redes Costa Pereira que recebeu o troféu se o capitão José Águas andava por perto e, por sinal, bem aprumado e equipado para a poder receber?
Adicionado pelas 02:05 após envio (00:42) do dedicado leitor deste blogue Victor João Carocha

Na final (2 de Maio) já tudo se sabe
O que se dizia (escrevia) era que a eliminação do Real Madrid CF em 1960/61 resultara de um acidente, um “dia mau”. O FC Barcelona tivera sorte, sabendo usar a rivalidade para se empolgar (o actual termo, motivar). Até ficara em 4.º lugar no campeonato espanhol. Em 1961/62 seria reposta a normalidade que consagrava os clubes europeus como campeões do “Velho Continente”. Béla Guttmann deve ter ido a Madrid observar o adversário. Era “só” comprar bilhete de comboio entre Lisboa e Madrid! Ou ter algum contacto em Madrid de alguém que enviasse informações. Até nisto foi um inovador. Manuel da Luz Afonso (já falecido) que sucedeu, nas eleições em 31 de Março de 1962, a Gastão Silva (ainda entre nós, num Lar de Idosos, em Caldas da Rainha - clicar para ver em 1 de Abril de 2014: O Último dos Grandes - mas muito debilitado na memória) disse-me que Guttmann tinha muitos contactos "em todo o lado". O campeonato espanhol terminou em 1 de Abril de 1962. A minúcia como descreveu cada jogador adversário e o modo como jogavam em conjunto era muito superior ao que era publicado nos jornais a que “qualquer mortal tinha acesso”. Apesar de muitos também serem conhecidos dos embates entre selecções, Béla Guttmann não adivinhava. Sabia! Do que falava, mas fazia segredo. Era muito reservado, considerando que os seus segredos valiam "boa maquia". Permitiam-lhe fazer bons contratos como treinador. Passava por mago e feiticeiro. E isso no Futebol era importante. Impressionava os futebolistas, dirigentes e adeptos nas declarações aos jornais. Como que adivinhava. Todas as indicações que deu antes do jogo decisivo (o Real Madrid ia entrar a resolver o jogo) e ao intervalo (o adversário iria cair a pique e seria incapaz, emocionalmente, de recuperar de um resultado desfavorável enquanto se esgotariam os minutos e as forças) revelaram-se certas. Os futebolistas acreditavam que ele adivinhava. E de certo modo adivinhava. Nem todos os jogos corriam segundo aquilo que dizia! Mas a grande parte deles eram jogados "tal e qual" como ele dizia. O que era um facto consumado – Real Madrid CF conquistar o sexto troféu – esfumou-se perante um Benfica empolgado, assertivo, sem temor, dotado de um colectivo que fazia sobressair as individualidades em vez de serem estas a puxar pela equipa. De 0-2 a 2-2. De 2-3 (ao intervalo com três golos de Puskas: 18', 23' e 39') a 5-3 (25': Águas; 33': Cavém; 50': Coluna; 64' e 69': Eusébio). Eis como um David Benfica derrotou, sem mácula, o Golias de Madrid!
E provará sempre que por muito que haja favoritos (como o Real Madrid CF ou o FC Bayern Munique), embora num jogo seja mais fácil que a duas mãos, haverá sempre um SL Benficadisposto a mostrar que o Futebol é mesmo assim…

As semelhanças (e diferenças) entre o SL Benfica e a Juventus FC ficam para amanhã!



Acredita Benfica!

Alberto Miguéns



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