Benfica
As inimizades coloridas (sobre alguns problemas actuais a cores e a preto e branco)
"Antes da era Madaíl o papel da Selecção portuguesa nestes torneios de apuramento era muito parecido com o actual papel da Bósnia
PRONTO, já está. Terminou a era Gilberto Madaíl na presidência da Federação Portuguesa de Futebol com mais uma qualificação para uma fase final de um grande torneio internacional e convém recordar, em tempo de balanço, que antes de Madaíl as coisas não se passavam bem assim. Antes pelo contrário.
Quase se pode dizer que antes de Madaíl o papel da selecção portuguesa nestes torneios de apuramento era muito parecido com o actual papel da selecção da Bósnia-Herzegovina. Lá íamos quase até ao fim a sonhar com a qualificação e depois, no fim, acabávamos quase sempre por ser eliminados por selecções mais fortes e melhor preparadas.
E lá vinha a choradeira do costume. Os árbitros, as manigâncias da UEFA e da FIFA, as condições climatéricas, o estado da relva, os nossos inimigos internacionais, o dinheiro ou a falta dele, as porcarias por varrer. Lembram-se?
Eu lembro-me. E por isso a choradeira da semana passada sobre a relva bósnia e a maldade da UEFA fez-me temer o pior.
Mas o Cristiano Ronaldo deu cabo disso tudo na noite de anteontem na Luz.
Assim é que ele é bom, a jogar.
HULK jogou os dois encontros amigáveis, contra o Gabão e contra o Egipto, pela selecção do seu país. Não marcou nenhum golo mas exibiu-se em bom plano e, assim sendo, despertou a curiosidade da imprensa brasileira que mal o conhece, valha a verdade, porque o percurso adulto de Hulk foi feito primeiro no Japão e, agora, em Portugal, países cujos campeonatos não são seguidos com enorme atenção no Brasil.
Por duas vezes titular na equipa de Mano Menezes, o avançado do FC Porto tornou-se finalmente bem conhecido no país onde nasceu e as entrevistas não param, todos querem saber mais sobre Hulk, o Incrível.
E, como não podia deixar de acontecer, até as mudanças da cor do cabelo do jogador são tema de interesse paraa imprensa brasileira.
Ao site 'Globoesporte', Hulk falou sobre as colorações e as descolorações capilares a que se tem submetido. 'Há um mês, acordei e fui lá no salão porque resolvi pintar de louro. Ficou um pouco diferente. Quem sabe se não o faço novamente?'
Com tropical malandrice, o entrevistador brasileiro perguntou-lhe se admitia alguma vez pintar o cabelo da cor do clube rival, o Benfica, e Hulk foi peremptório na resposta: 'De vermelho? Nunca!'
Francamente, penso que Hulk está a exagerar no anti-vermelhismo. Até pode não gostar da cor, e está no seu pleno direito. Mas, dando-se o caso de gostar dos vermelhos tanto como gosta dos amarelos, que já lhe vimos a emoldurar a cabeça, não tem que recear represálias.
Bastar-lhe-ia dizer que aquele vermelho não era o vermelho do Benfica mas sim o vermelho do Sporting de Braga e não haveria ninguém no Estádio do Dragão que lhe levasse a mal, antes pelo contrário.
E que ninguém considere esta discussão uma variante de racismo em nome das inimizades coloridas que têm marcado a agenda retórica do nosso futebol.
Cores são apenas cores. Tome-mos o exemplo ainda mais recente do Sporting. O presidente Godinho Lopes enviou uma 'newsletter' a todos os sócios do clube de Alvalade pedindo-lhes que no domingo compareçam 'todos verdes' ao jogo com o Sporting de Braga a contar para a Taça de Portugal a cores e a preto e branco.
Lá se vão esgotar os pólos verdes de marca nas grandes superfícies comerciais da Grande Lisboa.
O futebol joga-se a cores, não restem dúvidas. Tenho amigos sportinguistas que estão muitos encantados com o Alan porque chamou racista ao Javi Garcia e que estão muito zangados com o Eusébio porque o Rei, numa entrevista ao 'Expresso', chamou racistas aos sportinguistas do bairro em que cresceu em Lourenço Marques.
O Eusébio da próxima vez que for a Alvalade vai ter de ouvir uns remoques. Mas ainda não se sabe quando será essa próxima vez.
Já da próxima vez que o Alan for a Alvalade vai ser recebido com fidalguia e carinho. E é já no próximo domingo, quando o Sporting de Braga vier a Lisboa jogar com o Sporting na próxima eliminatória da Taça de Portugal.
No domingo que não se lembre o Alan de marcar golos ao Sporting não vá arruinar assim esta nova amizade tão inesperada.
NA semana passada, o Gabão-Brasil começou com quase vinte minutos de atraso. Tratava-se da festa de inauguração do moderno estádio de Liberville mas uma falha na electricidade deixou o relvado às escuras e o jogo teve de esperar.
Aconteceu em Liberville o que aconteceu em Braga, resumindo e concluindo.
Ambos são estádios modernos e funcionais. São coisas que acontecem. Não vale a pena especular.
NA euforia da vitória e da consequente qualificação para o Euro 2012, Paulo Bento esticou-se um bocadinho no seu ajuste de contas com Ricardo Carvalho e Bosingwa, o que já de si era absolutamente desnecessário, afirmando com ares de triunfador que o jogador do Real Madrid e o jogador do Chelsea iam estar no Verão com a selecção portuguesa na qualidade 'de espectadores'.
São imensamente respeitáveis as razões que levaram Paulo Bento a prescindir de Ricardo Carvalho e de Bosingwa com posições cativas nas equipas lideradas primeiro por Luiz Filipe Scolari e depois por Carlos Queiroz.
Ambos, primeiro Bosingwa, depois Carvalho, lhe faltaram ao respeito, como é do conhecimento geral. E um líder que não se dá ao respeito está positivamente tramado perante o grupo. A forma valente e solidária como a selecção nacional se bateu nos dois jogos com a Bósnia é a prova de que Paulo Bento não perdeu o controle sobre a equipa e essa é uma vitória pessoal que ninguém lhe pode roubar.
O que não é do conhecimento geral é a forma como Paulo Bento, na sua qualidade de seleccionador nacional, gere os egos, absurdamente inflacionados, das grandes vedetas do futebol português que, por isso mesmo, por serem grandes jogadores e enormes vedetas são naturalmente seleccionados para jogar pela equipa nacional.
Será necessária para exercer o cargo de seleccionador uma licenciatura em gestão de vaidades? E outra em conflitos de egos?
Porque foi disso mesmo que se tratou. Ricardo Carvalho, que parece ser uma pessoa doce, e Bosingwa, que não se parece com um meliante, não suportaram a desconsideração do colete-de-suplentes nos treinos da selecção.
Em Óbidos, Carvalho desarvorou porta fora e não demorou tempo a que todos percebêssemos o que se tinha passado. Na Suíça, antes do amigável com a Argentina, Bosingwa à vista do mesmo colete, preferiu não desarvorar. Mais lhe valia que o tivesse feito. Bosingwa decidiu afrontar Paulo Bento cara a cara, dirigindo-se ao líder em termos inaceitáveis: 'Ainda julgas que estás a treinar os juniores do Sporting.'
Compreende-se que Paulo Bento se tenha sentido ofendido.
E tudo isto já foi há algum tempo. Os juniores do Sporting ainda nem sequer tinham ido a Angola passar aquele mau bocado perante a selecção de Lito Vidigal...
Parabéns ao Paulo Bento que pegou numa selecção desmotivada e à deriva, sofrendo a bom sofrer ressaca do Mundial, e a levou até ao Europeu 2012 quando muitos já achavam a empreitada mais do que tremida.
Parabéns ao Paulo Bento por não ter cedido à lamachice nacional nos casos Ricardo Carvalho e de Bosingwa, dois excelentes jogadores que se deram à morte por vedetismo. Se Paulo Bento tivesse recuado seria certo a sabido que nunca mais ia ter mão na rapaziada.
Mas era escusada esta estocada final no ego dos insurrectos. Foi cruel. Foi uma pena."
Leonor Pinhão, in A Bola
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