Benfica
Nada poderia derrotar o Benfica! - Nem o Barça, nem os ursos, nem o passarinho...
"Foi há 50 anos que o Benfica espantou o mundo do Futebol ao conquistar a Taça dos Campeões Europeus. Uma vitória frente ao poderoso Barcelona catapultou Costa Pereira, Mário João, Ângelo, Neto, Germano, Cruz, José Augusto, Santana, José Águas, Coluna e Cavém para a fama.
BERNA é uma cidade pequena, medieval. Foi, no passado, terra de ursos: Bär é uma palavra alemã para urso e diz-se que foi o Duque Berthold V de Zähringen que lhe deu o nome depois de aí ter matado um urso.
Ainda hoje há ursos perto de Berna: em Nydeggbrüke, na Fossa dos Ursos. Por causa de Berna e dos ursos, no ano seguinte, em Amesterdão, na final da Taça dos Campeões frente ao Real Madrid, o Benfica seria presenteado com um urso bebé. A mascote seria, depois entregue ao Jardim Zoológico.
Foi no Wankdorf Stadium que a Alemanha bateu a invencível Hungria (3-2) na final do Campeonato do Mundo de 1954. Um estádio fadado para surpresas.
O Benfica parecia condenado a ser Campeão Europeu desde aquele dia, em finais de Setembro, no qual batera o Hearts, em Edimburgo, por 2-1. Daí até à final, seis vitórias, um empate e uma derrota, vinte e três golos marcados e oito sofridos. Impressionante!
No «Tribune de Lausanne» escreveu-se: «Nada poderia derrotar o Benfica. Mesmo que houvesse um 'penalty', marcado por Kubala, certamente um passarinho voaria sobre a área dos portugueses e levaria a bola, afastando-a da baliza...»
Kubala, Suarez, Evaristo, Koczis e Czibor. Provavelmente a melhor linha avançada do Mundo.
O Barcelona
Ladislao Kubala: conhecido por «Grande Lazlo»; nascido em 1927, em Budapeste, era de origem eslovaca; joga no Ganz e no Ferencvaros; em 1945, após a morte do pai, vai viver com a mãe para Bratislava e joga no Slovan; regressa à Hungria no ano seguinte para jogar no Vasas; a situação política empurra-o para Itália em 1948 e, daí, segue para Espanha e para o Barcelona onde joga até final de 1961; foi 6 vezes «internacional» pela Hungria, 10 pela Checoslováquia e 19 pela Espanha; excelente rematador, hábil, atlético, era famoso pela forma como surgia na grande-área adversária nos lances de conclusão.
Luisito Suarez: nascido na Corunha em 1935; começou no Desportivo, passando depois para o Barcelona; Bola de Ouro do «France Football» em 1960, transfere-se nesse ano para o Inter de Milão; dez anos depois terminaria a carreira na Sampdoria; 31 «internacionalizações» pela Espanha, sendo Campeão da Europa em 1964.
Evaristo de Macedo: nascido no Rio de Janeiro, em 1933; jogou no Madureira e no Flamengo antes de se transferir para o Barcelona em 1957; em 1963, trocou o Barça pelo seu grande rival, Real Madrid, onde ficou até 1965; acabou a carreira no Flamengo e foi «internacional» brasileiro por 14 vezes; goleador temível fez 173 golos em 219 jogos pelo Barcelona.
Sandor Koczis: nascido em Budapeste, em 1929; conhecido pelo «Cabeça de Ouro» pela qualidade do seu jogo aéreo; formava com Czibor a dupla de pontas-de-lança da famosa selecção húngara de 1954; jogou no Honved e no Young Boys de Berna antes de se transferir para o Barcelona em 1958 na companhia de Czibor; em 68 jogos pela Hungria marcou 75 golos.
Zoltán Czibor: nascido em Budapeste, em 1929; o seu feitio excêntrico, dentro e fora do campo, valeu-lhe a alcunha de «Passáro Louco»; ponta-esquerda de drible imprevisível; após a invasão soviética da Hungria, em 1956, fugiu para Itália com alguns dos seus companheiros do Honved; foi suspenso por dois anos pela FIFA; em 1958, por influência de Kubala, assinou pelo Barcelona; jogou 43 vezes pela selecção da Hungria e marcou 17 golos.
O 'Monstro Sagrado'
Mas o Benfica tem Coluna, o 'Monstro Sagrado', nascido em Lourenço Marques, Moçambique, no dia 6 de Agosto de 1935. Mário Esteves Coluna: muito provavelmente a mais carismático jogador da história do Futebol português. Grande «capitão» do Benfica durante sete épocas (sucedeu a José Águas), o seu estilo calmo e a sua figura imperial fizeram dele um jogador profundamente respeitado, tanto por colegas como por adversários e árbitros. Era dono de um Futebol elegante e muitas vezes explosivo na forma como rematava de longe à baliza adversária com força e eficácia. Mário Coluna somou 525 jogos oficiais pelo Benfica, marcando 127 golos. Dois deles foram marcados em finais da Taça dos Campeões Europeus: em 1960/61, frente ao Barcelona, aos 55 minutos, fazendo o 3-1 (resultado 3-2), e em 1961/62, frente ao Real Madrid, aos 50 minutos, fazendo o 3-3 (resultado final 5-3). Jogaria ainda mais três finais da Taça dos Campeões, frente ao Milan (1-2), ao Inter (0-1) e ao Manchester United (1-4), tendo cumprido nessa final o seu 50.º jogo para as taças europeias.
E tem José Augusto, ponta-direita, chegado ao Benfica em 1959, pela verba de 350 contos para o Barreirense e 130 contos para o jogador. Dinheiro bem empregue. Mas suas 11 épocas pelo Benfica, José Augusto foi 8 vezes Campeão Nacional, venceu 3 Taças de Portugal e 2 Taça dos Clubes Campeões Europeus. Fez parte das suas famosas linhas avançadas do Benfica, primeiro com Santana, Águas, Coluna e Cavém, depois com Coluna, Eusébio, Torres e Simões. Em 11 épocas no Benfica, José Augusto somou 369 jogos oficiais, marcando 175 golos, José Augusto jogou 5 finais da Taça dos Campeões. Foi «internacional» por Portugal 45 vezes, marcando 9 golos, e sendo um dos famosos «Magriços» que em 1966 tanto brilharam no Campeonato do Mundo de Futebol em Inglaterra.
O polivalente Cavém
E tem Cavém: Dominicano Barrocal Gomes Cavém nascido em Vila Real de Stº António no dia 21 de Dezembro de 1932. Esteve no Benfica de 1955 a 1969. Foi 9 vezes vencedor do Campeonato Nacional, venceu 2 Taças dos Campeões e 5 Taças de Portugal, uma delas com um golo seu aos 15 segundos, frente ao FC Porto (1-0). Fez 420 jogos com a camisola do Benfica, marcando 104 golos. Foi defesa direito, defesa central, defesa esquerdo, médio direito e médio esquerdo, sempre com a mesma pendular eficácia.
E tem Germano: Germano Luís de Figueiredo nascido em Lisboa, no dia 23 de Dezembro de 1932, considerando por muitos como o melhor defesa-central do Futebol português de todos os tempos.
O 'Matador' José Águas
E tem José Águas, o «capitão» avançado-centro finíssimo, nascido no dia 9 de Setembro de 1930, em Luanda, e descoberto em Lobito pelos olheiros do Benfica.
Goleador felino, com um jogo de cabeça temível, somou 379 golos em 384 jogos oficiais pelo clube da águia. Foi 5 vezes campeão nacional, venceu 7 Taças de Portugal e 2 Taças dos Campeões. Somou 25 «internacionalizações» por Portugal e marcou 11 golos.
E tem Costa Pereira e Mário João; e tem Ângelo, Neto e Cruz e Santana.
E tem, sobretudo, uma raça impressionante que resiste e se sobrepõe à soberba catalã.
Foi de Kocsis o primeiro golo do jogo, marcado ao minuto 20. O Benfica treme por momentos. Czibor e Evaristo estão à beira do 2-0. Mas, dez minutos depois, um lance de Cavém e um erro do guarda-redes Ramallets deixam a bola à mercê de José Águas sobre a linha de golo: 1-1. Mais dois minutos e Vergés, de cabeça desvia um centro de Neto para dentro da sua própria baliza: a bola bate no poste, Ramallets ainda desvia com as mãos, mas o árbitro Gottfried Dienst não tem dúvidas: 2-1.
O Barcelona força. Lança-se em desespero sobre a área de Costa Pereira. Os minutos finais da primeira parte e os primeiros dez minutos da segunda são terríveis para a defesa do Benfica.
Ao minuto 55, Coluna, a uns trinta metros da baliza, acorre a uma bola que pinga na sua frente e dispara com potência junto ao poste esquerdo de Ramallets: 3-1.
Atordoados, os catalães demoram a reagir. Mas a sua revolta é tremenda. Marcam o segundo golo a quinze minutos do final do jogo, por Czibor. E é então que a palavra sorte entra no dicionário dos grandes momentos da história do Benfica: Kubala remata, a bola embate no poste direito de Costa Pereira, rola sobre a linha de golo, bate no poste esquerdo e lança-se nos braços do guarda-redes encarnado; Czibor chuta à trave; Czibor, isolado, tem um pontapé fortíssimo mas à figura de Costa Pereira.
Três lances que os «culés» do Barça nunca esquecerão.
Dienst apita: uma, duas, três vezes.
Os adeptos portugueses invadem o relvado e transformam o Wankdorf Stadium num pandemónio. Os jogadores correm na sua frente, tentando manter as camisolas, os calços, as meias.
É ao «capitão» Águas que cabe levantar a Taça dos Campeões Europeus. O seu sorriso atravessará décadas.
O regresso a Lisboa é apoteótico. O aeroporto da Portela está entupido de gente. Dirigentes, jogadores, simples adeptos: todos esperam pela chegada dos Campeões Europeus. Uma história que fica para a história!"
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Afonso de Melo, in O Benfica
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