Benfica
O Fergunson da Luz
"Já fui tão crítico de Jesus que nem Jesus me levará a mal que o elogie, sublinhando, apenas, o que há algum tempo aqui deixei escrito sem qualquer ironia: se eu fosse o presidente do Benfica renovaria o contrato de Jesus por dez anos. E depressa, não vá o Benfica querê-lo, um dia destes, e não o querer Jesus.
Não me lembro, francamente, quem o disse mas alguém disse recentemente (e se calhar nem foi de todo original) que Jesus poderia muito bem vir a ser o Alex Ferguson do Benfica.
Arriscando ter acertado ligeiramente ao lado, porque sinceramente não sei em qual das freguesias da Amadora nasceu Jesus, também um dia lhe chamei o Mourinho da Brandoa, com respeito e sem ofensa, porque apesar dos diferentes planos, Jesus mostrou há muito coisas de Mourinho - na forma de liderar a equipa, nalguma agressividade para o exterior, no estilo a trabalhar jogadores...
A primeira comparação com Alex Ferguson veio da pastilha elástica que o treinador do Benfica, à semelhança de Ferguson, costuma mastigar em pleno jogo.
E agora, quando alguém diz que Jesus poderia vir a tornar-se o Ferguson da Luz, não estará propriamente a comparar carreiras, estará obviamente a referir-se ao que me refiro: bem vistas as coisas, talvez não fosse má ideia o Benfica renovar o contrato de Jesus por dez anos!
Jesus põe ou não põe o Benfica a jogar à bola? Põe!
Jesus melhora ou não melhora as qualidades dos jogadores? Melhora!
Jesus transforma ou não um bom médio num óptimo defesa? Transforma!
Jesus tem ou não tem aprendido a ser treinador de um grande clube como o Benfica? Tem!
Jesus é ou não um treinador ambicioso? É!
Jesus conhece ou não conhece bem o futebol português? Conhece!
Jesus está ou não está cada vez mais identificado com a cultura da Luz? Está!
Jesus revela ou não uma tremenda paixão pelo futebol? Revela!
Jesus vive ou não vive intensamente para o trabalho? Vive!
Jesus luta ou não luta pelo espectáculo? Luta!
Jesus está ou não está na galeria dos treinadores positivos? Está!
Jesus faz ou não faz bem ao futebol? Faz!
Reafirmo: já fui tão crítico dos comportamentos de Jesus - longe de mim ser crítico das capacidades e qualidades técnico-tácticas do treinador do Benfica - que talvez surpreenda o próprio Jesus com esta opinião.
Jesus parece ter moderado (e de que maneira) uma certa arrogância; parece ter melhorado (e muito) a comunicação; parece ter ficado um pouco mais humilde; parece ter compreendido melhor a dimensão das coisas num clube tão grande como o Benfica, e sobretudo parece ter percebido como a ciência do futebol não faz do futebol uma ciência.
Jesus está mais aberto; mais tolerante; mais participativo; partilha mais e já evita muito mais aquele ar de quem tem a mania que sabe tudo. Já sabe melhor que mesmo sabendo não precisa de dar o ar que sabe.
Se é que entendem.
Apesar de tudo isso, Jesus não perde a identidade. Nem deve, como é evidente. E muito menos deve alguma vez sentir-se refém dos erros que possa ter cometido nos dois anos que levou de Benfica e nos quais pouco ganhou.
Deve Jesus continuar no Benfica por não se saber se depois de Jesus será o caos?
Não, claro que não!
Talvez haja quem defenda Jesus por receio da sucessão.
Não é o caso.
Jesus mastiga pastilha elástica mas isso não é um problema.
Gosta, à sua maneira, de cuidar da imagem e isso só lhe fica bem.
Terá uma franqueza nem sempre bem compreendida mas isso também Mourinho.
Os erros? Parece vir aprendendo pelo menos com alguns, isso é claro.
Este ano, e de repente, Jesus perdeu Javi Garcia, Witsel e, não lhe faltava mais nada, o imprudente Luisão.
O futebol já nos mostrou como em muitas situações semelhantes, treinador e equipa são incapazes de resistir. Pois Jesus fez muito mais do que resistir.
Reequilibrou a equipa e deu-lhe substância. E mesmo sem núcleo duro motivou-a, devolveu-lhe a confiança e refez-lhe a voz de comando.
Melgarejo cresce; Lima integra-se; Matic surpreende; Enzo Perez revela-se; Salvio confirma-se; Jardel reage; André Almeida e André Gomes surgem e Ola John já brilha.
Se o mérito não é do treinador é de quem?
Nestes últimos tempos, no Benfica, é verdade que se foram perdendo alguns anéis, mas sempre foram ficando os dedos.
E os dedos, como sempre, são o mais importante!"
(...)"
João Bonzinho, in A Bola
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