O passado não importa mesmo
Benfica

O passado não importa mesmo


"Quanto ao Benfica, se quiser ser campeão, tem de ir ao Porto fazer, no mínimo, aquilo que o Olhanense já lá fez esta época.

Quinta-feira, 2 de Maio
O dia começou com a leitura dos jornais e com os ecos das declarações de Vítor Pereira entregando o título ao Benfica, dando-lhe por garantida a vitória sobre o Estoril na próxima segunda-feita, lançando suspeitas sobre a intervenção do presidente do Marítimo no desfecho do jogo do Benfica no Funchal e desvalorizando com grande azedume a Liga Europa, competição de que o seu FCP se viu sonoramente afastado na última época vergado ao peso de uma inóspita goleada na casa do tal Manchester City que haveria de ser, logo a seguir, eliminado pelo Sporting na mesma competição e, algumas semanas mais tarde, campeão de Inglaterra.
O último campeonato inglês resolveu-se, aliás, de modo pouco menos do que alucinado. O City conquistou o título que lhe fugia há décadas nos últimos instantes do tempo complementar do último jogo da prova. Coisas que acontecem no estrangeiro.
No momento mais quente do último campeonato que o Benfica ganhou, vai para três anos, também veio a terreiro o treinador do FC Porto no tudo-por-tudo que lhe competia em função dos interesses do emblema. Só que, ao contrário de Vítor Pereira, Jesualdo Ferreira não se apresentou sozinho na sala de imprensa.
Antes pelo contrário. Levou consigo a equipa toda do FCP. E nem teve que abrir a boca porque a responsabilidade do discurso político foi entregue ao guarda-redes suplente Nuno Espírito Santo. Lembram-se?
Curiosamente, os únicos 2 pontos que o FCP perdeu em casa no campeonato em curso foram-lhe sacados pelo mesmo Nuno Espírito Santo, na pele do treinador do Olhanense que foi ao Dragão cometer o desacato de empatar o jogo.
Imagine-se... logo o Olhanense que desde cedo luta para não descer, que de tão titubeante até já vai no quarto treinador e que, há coisa de semanas, só conseguiu reunir os seus jogadores para a recepção ao Benfica porque um amigo anónimo do presidente apareceu com uma mala forrada a notas para pagar os ordenados atrasados dos seus profissionais.

Carlos Pereira, ponha os olhos nisto!
A solidão de Vítor Pereira na sala de imprensa do Dragão confere-lhe, caso o FCP venha a revalidar o título, mérito total e exclusivo. Abandonado pela estrutura, pelos adeptos e até pela crítica, Vítor Pereira foi sozinho ao tudo por tudo, sem medo das palavras, das apostas feitas e sem medo do ridículo que, nestes casos, é sempre o que mais se deve temer.

O dia terminou com a qualificação do Benfica para a final da Liga Europa onde terá como adversário o Chelsea, apenas o campeão europeu em título. Os ingleses são claramente favoritos e essa é, vista à distância, a vantagem maior do Benfica que não tem de modo algum uma segunda linha de qualidade da segunda linha ao dispor de Rafa Benítez.
Nesta altura da época, em que tudo se decide, o pormenor da segunda linha é muito importante. O Benfica tem vindo a fazer uma época muito valorosa considerando, por exemplo, que só dispõe de dois médios: Matic e Enzo Perez, sendo o argentino uma adaptação feliz ao posto.
Os demais ou são muito novos e inexperientes ou são entradotes na idade e cheios de maleitas pelo que nunca foi possível contar nem com uns nem com os outros de modo regular, efectivo e satisfatório apesar da boa vontade geral.
Mas foi uma bela jogatana contra o Fenerbahçe, lá isso foi. Agora é atirar com a pressão toda de ter de ganhar para cima do Chelsea e esperar, tranquilidade, que ninguém de crucial se lesione até à final de Amesterdão.
Este Benfica tem lidado com muita pressão e até sabe bem passar esse peso, essa responsabilidade, para o adversário que é, francamente, mais poderoso.

Sexta-feira, 2 de Maio
ENTREVISTADO pela Benfica TV, Luís Filipe Vieira escolheu o dia de hoje para afirmar que Jorge Jesus é o seu treinador e que, por isso mesmo, «vai continuar de certeza».
Sobre o assunto já ouvi de tudo. Até adeptos que ansiavam há meses pela notícia ouvi virarem-se contra o presidente. Gente supersticiosa, naturalmente.

Sábado, 4 de Maio
FOI um passeio a viagem do FCP ao Funchal para jogar com o Nacional que se despediu sem mágoas e alegremente do sonho da Liga Europa.
Tão alegremente se despediu o Nacional que, nos últimos instantes do jogo, os seus adeptos desataram a cantar «SLB, SLB, Glorioso, SLB» para espanto e repúdio dos comentadores da televisão que logo censuraram com palavras avisadas o canto dos tresloucados insurrectos.
O presidente do Marítimo que ponha os olhos no presidente do Nacional.

Domingo, 5 de Maio
ENTÃO, Pepe? O que é isso de vir agora atirar-se ao seu treinador, e ainda para mais um seu meio-compatriota, em defesa do Iker Casillas?
Há brechas no castelo português de Chamartín depois da eliminação nas meias-finais da Liga dos Campeões. Isto é mau para a nossa imagem externa. Dá ideia de desunião nacional.
«Em relação ao Casillas tem de haver um pouco mais de respeito. As declarações do treinador não foram as mais adequadas, Casillas é uma instituição no Real Madrid e em Espanha», disse o Pepe que, por sua vez, era uma instituição no eixo central da defesa do Real Madrid até chegar Varane.
O Paços de Ferreira segue embalado para a Liga dos Campeões. Hoje à noite, no seu campo, venceu o Sporting por 1-0, com alguma felicidade, é verdade, mas também conta. Queixam-se os sportinguistas de uma grande penalidade perdoada aos amarelos por Pedro Proença a cumprir o seu jogo de rodagem para o clássico que se avizinha no Dragão. Só pode ser, não é? Tem de haver coerência.
No entanto, foram mais os sportinguistas a queixarem-se das palavras de Jesualdo Ferreira na antecipação ao jogo por ter concedido, sendo o treinador do Sporting, o favoritismo ao Paços de Ferreira. Talvez porque o dito Paços de Ferreira seguia (e segue) no 3.º lugar com mais 14 pontos (agora 17 pontos) do que o Sporting.
O realismo do professor caiu mal. O que não o impede de ser realista. O tempo em que o treinador do Sporting garantia que «ganhar é como lavar os dentes» já lá vai. Respeito.

Segunda-feira, 6 de Maio
MARCO SILVA, é mais um jovem treinador português com muita qualidade e isso mesmo ficou provado hoje na Luz. O seu Estoril jogou quase sempre muito bem, travou o Benfica e esteve sempre mais perto de ganhar o jogo do que de o perder. O resultado para os donos da casa que jogaram os últimos quinze minutos com menos um jogador por causa do tal problema dos médios que já tinha vindo a propósito na última quinta-feira.
Enzo Perez magoou-se e foi substituído por Carlos Martins que só esteve 9 minutos em campo tal foi a rapidez com que acumulou dois cartões amarelos. Faltou «inteligência emocional» a Martins disse Jorge Jesus no fim do jogo recorrendo a um eufemismo no mínimo generoso. Cá está, na fase decisiva da época, o problema da segunda-linha no meio-campo do Benfica em todo o seu esplendor.
No fim do jogo, natural e merecidamente feliz, o treinador do Estoril atirou-se a quem tinha condenado o Estoril a uma derrota certa e inapelável na Luz. Ou seja, atirou-se ao Vítor Pereira. Porque, na verdade, nem o treinador, nem o presidente, nem os jogadores do Benfica cometeram a imprudência de vir a público considerar o jogo com Estoril como de 3 pontos em caixa.
A pressão do título volta assim para o Dragão, obrigado a vencer o Benfica para se recolocar na liderança a uma jornada do fim do campeonato. Quanto ao Benfica, se quiser ser campeão, tem de ir ao Porto fazer, no mínimo, aquilo que o Olhanense já lá fez esta época.
Às vezes, acontece.

Terça-feira, 7  de Maio
«O problema de Pepe chama-se Varane. É frustrante para um jogador de 31 anos ser atropelado por um miúdo de 19 anos. Toda a gente compreende isto», disse Mourinho. É verdade. Até eu tinha percebido.

Quarta-feira, 8 de Maio
«O passado não importa», disse recentemente Jorge Jesus. Houve quem não gostasse. Mas à luz do resultado com o Estoril e da obrigatoriedade de fazer bom papel no Dragão esta coisa do «passado não importa», se calhar, não está mal vista. Antes pelo contrário. O passado não importa. Gosto."

Leonor Pinhão, in A Bola

PS: Hoje, a Leonor, cometeu alguns erros pouco habituais: confundiu o Cajuda - treinador do Olhanense - com o Nuno Espírito Santo; e esqueceu-se das muitas oportunidades de golo que o Benfica teve durante o jogo com o Estoril... mas acertou em cheio na nomeação do Proença!!! Mas essa, dirão alguns, era fácil!!!




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