Tanta e Tanta Glória Glorioso
Benfica

Tanta e Tanta Glória Glorioso


OPINIÃO

A marcação do golo 50 mil (e vão 50 004 golos em 80 edições do campeonato nacional, os quatro iniciais com o nome de campeonato da I Liga), dizia eu que é um bom pretexto para revisitar o passado e recordar alguns dos futebolistas que fizeram Grande, Muito Grande o Benfica e que nos trouxeram até ao presente. Se não fossem eles hoje não seríamos o que somos!




O campeonato da I Liga, que o Congresso da FPF em 1939 equiparou a campeonato nacional e por isso hoje podemos contabilizá-los como títulos de campeão nacional, surgiu após a copiosa derrota, por 9-0, da selecção nacional frente à Espanha em 11 de Março de 1934 no apuramento para o Mundial de 1934 cuja fase final se realizou em Itália. Nesse tempo os jornalistas desportivos (Ricardo Ornelas, Tavares da Silva, Cândido de Oliveira e Ribeiro dos Reis, por exemplo) eram respeitados, porque sabiam ser simples, mas também ter classe e credibilidade. Assim por insistência deles as Associações Regionais e por acréscimo a FPF foram obrigadas a abdicar da exclusividade de organizarem campeonatos a pontuar apenas a nível regional. Apesar dos apuramentos, até 1946/47, continuarem a ser feitos a partir das classificações nos Regionais. Um modelo híbrido que foi de transição.


A decisão do Congresso da FPF de 1939 que consta do Relatório de 1938/39 (cujo excerto o EDB reproduz). É devido a este artigo que há legitimidade para considerar os 4 campeonatos da I Liga como Campeonatos Nacionais e os 17 Campeonatos de Portugal como Taças de Portugal. Por isso temos 33 títulos nos CampeonatosNacionais (3 + 30) e 27 títulos nas Taças de Portugal (3 + 24)

O Primeiro
O sorteio - oito clubes e 14 jornadas - determinou para a 1.ª jornada, em 20 de Janeiro de 1935, com quatro jogos, futebol em três cidades: dois encontros em Lisboa (SL Benfica - VFC Setúbal e CF "Os Belenenses" - FC Porto) respectivamente nas Amoreiras e Salésias; um jogo em Coimbra (equipa da Associação Académica de Coimbra - Sporting CP no campo de Santa Cruz); e um jogo no Porto (Académico FC - União Futebol Lisboa, no estádio do Lima). Os jogos foram todos marcados para as 15 horas, mas segundo o "Jornal de Notícias" o encontro no estádio do Lima começou dezassete minutos depois...
Foi no campo das Amoreiras que se marcou o primeiro golo, aos seis minutos, após um remate de Valadas como descreve Ricardo Ornelas nas páginas do jornal "Os Sports". Valadas jogou a extremo-esquerdo, Carlos Torres (tio de José Torres) a avançado-centro e Esperança a médio-centro.


Os Sports n.º 1679; 21 de Janeiro de 1935; 1.ª página; Excerto da crónica de... Ricardo Ornelas


O segundo golo foi de Soeiro (Sporting CP) aos 12 minutos. Valadas fez o terceiro (2-0 para o "Glorioso") aos 15 minutos. Aos 20 minutos, José Luiz do CF "Os Belenenses" fez o quarto. O primeiro golo do FC Porto na história do campeonato nacional foi o oitavo da competição, aos 47 minutos (o primeiro golo na 2.ª parte na história do campeonato) por Nunes a repor o empate (1-1) nas Salésias. Numa jornada com 18 golos, Carlos Torres fez o 15.º golo, o 3-0 para o Benfica aos 70 minutos. O jogo acabou com 3-1 a favor do "Glorioso". É esta uma parte da história dos primeiros golos da primeira jornada do primeiro campeonato nacional.

Os Sports n.º 1679; 21 de Janeiro de 1935; 1.ª página; Primeiro ou terceiro golo no primeiro campeonato da I Liga, para o SLB o 1-0 ou o 2-0 (a legenda não é explicita)

O nosso Valadas
Um grande goleador, talvez o primeiro grande marcador de golos não sendo avançado-centro. Mas foi, certamente, o primeiro futebolista português a marcar muitos golos fora da grande área. Dotado de forte pontapé e com boa pontaria marcou 218 golos em 342 jogos com 36 fora da grande área. Alfredo Valadas Mendes nasceu na Mina de São Domingos (Corte do Pinto em Mértola) em 16 de Fevereiro de 1912 e faleceu em Lisboa, a 3 de Agosto de 1994, aos 82 anos. Encontrei-o a primeira vez no funeral de outra glória do Benfica, Francisco Albino em 27 de Fevereiro de 1993. Vergado pelo peso da idade pedi-lhe se me queria conceder uma "entrevista privada" (ou seja para arquivo pessoal). Disse-se "velho para isso". Mas com a preciosa ajuda do inesquecível Joaquim Macarrão consegui que me recebesse. Enquanto eu viver recordo esse momento como um dos melhores e mais significativos enquanto Benfiquista. Nunca mais esquecerei - pelo menos enquanto tiver memória - o Valadas. E nesse tempo nem sequer sabia - também pouco interesse tem - que Valadas marcou o primeiro golo no campeonato nacional português. Os media querem lá saber disso. Dá uma trabalheira saber e... Não vende.


Valadas num "cromo" de 1935. Gigante do "pontapé em brasa"

O grande Valadas
Depois de se iniciar no futebol no Mina de São Domingos FC e federado no Luso Sporting Clube, de Beja (capital distrital), ingressou no Sporting CP. Tinha 18 anos. Foi logo titular no SCP e imprescindível durante as duas temporadas - 1931/32 e 1932/33 - em que jogou no clube. Em 1932/33 jogou a final da Taça de Portugal (então designada Campeonato de Portugal) e obteve duas internacionalizações, em 1932 (Jugoslávia) e 1933 (Espanha). Mas... nunca se adaptou ao Sporting CP e ao tratamento diferenciado conforme os estratos sociais. Abandonou o clube e regressou a Beja, jogando em 1933/34 na filial do "Glorioso", o Sport Lisboa e Beja. Intencional ou não (nunca o admitiu publicamente) num tempo em que os clubes podiam impedir transferências directas a menos que os futebolistas não temessem parar uma época, o certo é que Valadas pôde regressar a Lisboa transferindo-se para o Benfica, onde encontrou o seu grande amigo Vítor Silva. Se não tivesse regressado a Beja nunca o Sporting CP permitiria que saísse do Lumiar para o Benfica! Até nisto Valadas foi gigante! Obrigado Mestre do Benfiquismo. Estreou-se no "Glorioso" em 5 de Outubro de 1934. Tinha 22 anos. Ficou dez temporadas até 1943/44. Em 1 de Dezembro de 1944 teve uma Gloriosa Festa de Despedida. Com o "Manto Sagrado" foram 29 926 minutos em 342 jogos, com 97 como capitão. Entre 1939/40 e 1942/43 foi o "capitão de época"! Em dez temporadas contribuiu para nove títulos: cinco campeonatos nacionais, três Taças de Portugal e um campeonato regional. Como ele dizia "É que quando se é uma vez verdadeiramente Benfica, não se pode ser mais nada!"

GOLOS "REDONDOS"
Época
Jor
Futebolista
Golo
N.º
65
Golos
Golo
N.º
Futebolista
Jor
Época
34/35
1
Valadas
1

34/35
1
Valadas
3
5








10
12
Carlos Torres
1
34/35




25
26
Vítor Silva
2
34/35
34/35
3
Valadas
43
50
55
Carlos Torres
4
34/35
34/35
5
Carlos Torres
75

34/35
7
Valadas
100

34/35
12
Fernando Cardoso
196
200
231
Carlos Torres
13
34/35
35/36
3
Luís Xavier
299
300
311
Valadas
4
35/36
35/36
8
Carlos Torres
394
400
412
Carlos Torres
10
35/36
35/36
14
Domingos Lopes
495
500
501
Espírito Santo
1
36/37
36/37
5
Rogério Sousa
589
600
602*
Rogério Sousa
6
36/37
36/37
11
Rogério Sousa
699
700
701
Valadas
11
36/37
37/38
2
Espírito Santo
792
800
809
Rogério Sousa
3
37/38
37/38
8
Valadas
887
900
901
Domingos Lopes
9
37/38
37/38
14
Luís Xavier
1 000

NOTA: * 601 Gatinho (CF "Os Belenenses") fez autogolo a favor do SL Benfica


Entre o 1.º e o 1000.º
Valadas disputou 136 jornadas das 160 jogadas pelo Benfica entre 1934/35 e 1943/44. Com um total de 89 golos em 12 240 minutos, marcou um golo a cada 137 minutos. Como seria de esperar, para quem marcava tantos golos, esteve em mais golos "redondos", por exemplo no 100.º, por onze não fez o 300 e por 13 não fez o 900. E por um não conseguiu o 700. Tal como Rogério Sousa que "antecipou-se" fazendo o 699! Quanto a Valadas, se tem marcado quatro minutos antes chegava ao 700 antes de Aníbal Rendas do Vitória FC de Setúbal...

O Mil
Foi na 14.ª e última jornada do 4.º campeonato da I Liga que foi marcado o 1000.º golo. E que jornada. O bicampeão Benfica chegava à derradeira jornada empatado pontualmente - 21 pontos - com o FC Porto mas com vantagem no confronto directo (V 3-1; E 2-2). Mesmo o Sporting CP (20 pontos) podia ser campeão. Quanto aos "golos redondos" após a 13.ª jornada de 1937/38 estavam marcados 993... faltavam sete para o 1000. Sabemos agora, porque na época ninguém se interessou por isso!

A grande equipa de 1937/38 tricampeã no IV Campeonato da I Liga. De cima para baixo. Da esquerda para a direita. Amaro, Albino, Rogério Sousa, Gustavo Teixeira (cap.), Vieira, Raul Baptista e Gaspar Pinto; Domingos Lopes, Valadas, Luís Xavier e Guilherme Espírito Santo. Fotografia publicada na página 7 da revista Stadium n.º 327 de 18 de Maio de 1938. Mas deve reportar-se à 5.ª jornada (20 de Fevereiro de 1938) na vitória, por 3-1, com o FC Porto. O jogo que deu a vantagem no confronto directo com o FCP para conquistar o título em igualdade pontual (23 pontos) com o FCP! Estes onze gigantes merecem nunca serem esquecidos

A última jornada decisiva para apurar o campeão
Os quatro jogos, em 8 de Maio de 1938, foram todos marcados para as 17 horas. Em Lisboa dois jogos: no nosso Estádio das Amoreiras o líder - que apenas dependia do seu resultado para se sagrar campeão - recebia a equipa da Associação Académica de Coimbra, classificada na 5.ª posição; no Estádio José Manuel Soares, nas Salésias, o CF "Os Belenenses" (4.º lugar) jogava frente ao FC Porto (2.º classificado). Os dois primeiros jogavam em Lisboa. O outro candidato - Sporting CP, 3.º lugar - jogava no Porto, no estádio do Lima, frente ao 8.º e último classificado, Académico FC. No Barreiro, no campo do Rossio, cumpria-se calendário com o FC Barreirense a receber o Carcavelinhos FC.


Os Sports n.º 2028; 9 de Maio de 1938; 1.ª página e página 4; Excertos da crónica de Rebelo da Silva (um dos autores da inigualável História do SL Benfica 1904 - 1954)

Aos 17 minutos Peyroteo coloca o Sporting CP na frente do jogo e do campeonato (... 22 pontos). Ao intervalo, pelas 17.45 horas estavam marcados cinco golos, ou seja, faltavam dois para o 1000.º golo. Mais do que isso havia muita ansiedade. O SCP estava a vencer por 2-0 e os dois da frente (SLB e FCP) empatados a zero golos. Provisoriamente três emblemas com 22 pontos! Após o intervalo, aos 48 minutos, Pinto Cunha do Académico FC do Porto reduz para 1-2 frente ao SCP. Estava feito o 999.º golo. Dois minutos depois, aos 50, Luís Xavier com uma cabeçada após Valadas (sempre ele...) ter marcado o pontapé de canto, faz 1-0 a favor do "Glorioso", marca o milésimo e mais importante do que isso, encaminha para o Benfica o terceiro título consecutivo. Obrigado, bom setubalense! O FC Porto faz dois minutos depois, aos 52, o 1-0 que lhe deu os dois pontos, terminando o campeonato em igualdade pontual com o Benfica que acabou por vencer por 3-1 a equipa da Associação Académica de Coimbra. Uma jornada com 17 golos elevou a contagem após os quatro campeonatos nacionais, para os 1010 golos.


Os Sports n.º 2028; 9 de Maio de 1938; Página 6; Golo mil no campeonato nacional, última edição com a designação de Campeonato da I Liga

O pequeno Gigante Luís Xavier
Luís Xavier Júnior nasceu em Setúbal, a 12 de Outubro de 1907 e faleceu em 25 de Janeiro de 1986, aos 78 anos. Infelizmente nunca falei com ele. Se eu pudesse voltar atrás... Foi no Vitória FC que se iniciou no futebol, onde jogou até à temporada de 1931/32 acabando por transferir-se para o "Glorioso" no final desta época. Estreou-se com o "Manto Sagrado"em 27 de Março de 1932, embora ainda tivesse contrato como jogador do Vitória FC, num encontro entre o Benfica e o FC Barcelona, para assinalar o 28.º aniversário do "Glorioso". Jogou a interior-direito, lugar de avançado que melhor potenciava as suas capacidades. Esteve oito temporadas no Clube até 1938/39 jogando pela última vez com o "Manto Sagrado" em 3 de Maio de 1939. Chegou com 24 anos deixou o futebol aos 31. Depois de 18 840 minutos a honrar o Benfica em 215 jogos, marcando 90 golos. Um golo a cada 209 minutos. Nessas nove temporadas consagrou o "Glorioso" com cinco títulos: três campeonatos nacionais, uma Taça de Portugal e um campeonato regional.

No campeonato nacional participou em 48 jornadas (4320 minutos) marcando 14 golos, ou seja, foi titular nos cinco primeiros campeonatos nacionais que tiveram um total de 70 jornadas. Deixou o futebol mas nunca deixou o Benfica. Em 5 de Outubro de 1943 foi um dos mais entusiastas na criação do Saudade, equipa que reunia, com orgulho as Glórias do Clube, porque no Benfica não há Velhas Glórias nem ex-Glórias. No Benfica as Glórias são Eternas. Como os diamantes. Porque são Benfica!


Luís Xavier num "cromo" de 1938. Um pequeno gigante

NOTA: A minha ideia era desenvolver neste texto todos os golos redondos do SLB, mas só faz sentido fazer isso podendo ilustrar com cromos e recortes da época. Tal tecnicamente não é possível, pois não consigo editar a "posta" por excesso de "peso" ao que parece. Vou ter de "partir" este tema em vários textos a publicar durante este Verão de 2014. Aos leitores quando lerem "Tanta e Tanta Glória Glorioso (parte II e seguintes...)" já sabem o que os espera...


O Cinco Mil
Arsénio

O Onze Mil
Francisco Palmeiro

O Dezassete Mil
Eusébio

O Vinte e Sete Mil
Carlos Manuel

O Trinta e Cinco Mil
João Pinto

O Quarenta e Sete Mil
Cardozo

O Cinquenta Mil
Enzo Perez

E mais "Miles" haverá
E o EDB - se ainda por cá andar - disso fará notícia.

E tudo tentará para honrar agora os ases que nos honraram o passado

Alberto Miguéns

Plano para Maio
(Previsão sempre à meia-noite):
De 16 para 17: Mostra o Que Vales;
De 17 para 18: As 38 Finais na Taça de Portugal;
De 18 para 19: E no Jamor a 39.ª Final?
De 19 para 20: Álvaro Gaspar (10.ª parte de 14);
De 20 para 21: Eu Benfiquista no Museu do FCP by BMG (parte II);
De 21 para 22: Tanta e Tanta Glória Glorioso (parte II);
De 22 para 23: Gostava Tanto Que...




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